sábado, 24 de janeiro de 2015

Vista de cima do Morro das Mortes

Assobiando um blues

Amanhece no tranquilo lugarejo das Mortes
Eu assobio um blues
O velho leiteiro passa com seu cavalo magro e manco
O louco asmático em transe manca
Cantando em bom tom canções bas fond.

O sino badala o despertar
O policial magro passa com seu carro negro
Parece um vilão de Chester Gould
Perseguindo meninos malucos
Agroboys ensandecidos.

Os verdadeiros malucos passam
Com seus bigodes aparados
E suas esposas hipocondríacas
Seus filhos bem nutridos
Com suas bugigangas eletrônicas
Posando como figuras opulentas
Com adornos ultrapassados.

Quem não acordou faz amor
Antes de se indispor
Tocando naquela ferida
Esmorecendo aquela indigesta relação
Separando sem nenhum perdão.

Pronto!
Mais dois solitários nos dias de festas
Dos bons samaritanos
Das religiões diversas
Onde abandonados procuram amparo
Na fila da desolação.

Mais personagens no cenário surreal
Da língua infame
Dos confrades do banco do veneno
Com suas zombarias fúteis
Destilando seus malogros
Das suas vidas inúteis.

O causídico paranóico
Disfarça um caminhar elegante
Com sua falta de vida
Seus pecados
Sua vileza
E sua vida perdida.

O andarilho passa
Com cara de feliz, senil e inseguro
Cheirando a aguardente
Diz que vai ganhar o mundo
E é uma estrela de um palco escuro.

O homem da loja que caçoava
Esta sem rumo
Tornou-se um personagem de sua derrisão
Agora prova seu veneno
Seus personagens lhe fazem escárnio.

O velho assexuado esta feliz
Mas ainda sofre de chiliques
Esta a serviço do politiquês
É um adulador aprendiz.

O auto-falante passa
Abusado, grasnando
Gritando sobejos
Tocando músicas triviais
Insanidades a varejo.

Pessoas tristes
Na fila da saúde
Senhoras com palpitações
Homens macambúzios
Pensando em ataúdes.

Os meninos caminham
Para a máquina de moer
Com suas mochilas descomunais
Entre as paredes da escola
Descobrem pouco saber
Mas aprendem a jogar bola.

As ambulâncias partem
Em busca da sorte
Levando o mórbido
E a mulher do fricote.

Seu companheiro que vagueia nos bares
Anseia a noite para os destilados
Bisbilhotar o alheio
Entre risos, algazarras e carteados.

O Rei esta nu
A corte finge não ver
Felizes nos rega-bofes
Vaidosos no poder
Vassalos vivem a anomalia
Perdem status e conceitos
Com parcas economias

Dias de festas
Toada, salmos e destilados
Esbórnia e pequenas arestas
Demodés políticos perfilados
Orgias e pouca cultura
O grande circo esta armado
Panis et circenses
Para o simples e bom camponês
Ver o mesmo diferente

Eu visto minha jaqueta verde
Caminho pelas ruas dos ingênuos
Assobiando um velho blues
Compassando as notas
Na manhã desafinada
Vivendo nos sonhos.

Sou uma sombra
Com um sorriso idiota.

Jaime Baghá ,  mais um personagem.


sábado, 10 de janeiro de 2015



“Eu também sou Charlie” 
Por sempre admirar artistas com a grandeza de Charb (Stéphane Charbonier), Cabu (Jean Cabut) e Wolinski (Georges Wolinski), que com seus traços e seu humor mostram toda a ignorância humana. Muitos cartunistas da minha geração foram importantes na forma como moldaram o meu senso crítico. Quando eu era jovem, via nossos grandes cartunistas brasileiros no semanário “O Pasquim”, com humor debochado, ferino, feroz, de sarcasmo irônico e criativo, que me fez conhecer nomes como Millôr Fernandes, Ziraldo, Claudius, Fortuna e Henfil. Estes, numa época de boçalidade e da opressão da ditadura, lutavam para mostrar a verdade, com coragem contra a censura, o preconceito e a vilania. Com este pessoal aprendi que a maior arma contra a ignorância é a caneta, com textos e traços ingênuos, porém grandioso e inteligente que diz tudo e mostra a fachada por detrás da máscara dos poderes doentios, fanáticos e dementes. Artista como Wolinski inspiraram muito de nossos melhores cartunistas brasileiros, os quais eu tenho a maior admiração por ter aprendido a ver o mundo e os fatos com maior clareza, e, a saber, distinguir melhor o caráter dos poderosos. Vivam os Pasquins, Viva os Charlie Hebdo e todos os jornais satíricos do mundo com seus escritores e cartunistas, que no papel de bufão e numa luta utópica, nos faz ver os vícios de uma sociedade e a verdadeira face dos hipócritas, dos intransigentes, dos fascistas, dos racistas, dos que discriminam e dos canalhas do mundo.
Jaime Baghá





terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Farol da Solidão - RS

Farol de Santa Marta - SC

Praia da Azedinha - Búzios

Mar de Salvador

Salvador - BA

Mergulho na Ilha de Itaparica - BA


EU E O MAR

Nasci na beira do mar de Torres, no Rio Grande do Sul. As primeiras e vagas lembranças são do meu pai puxando um carrinho de madeira comigo dentro que ele chamava de Cadillac, foi meu pai mesmo quem construiu. Nestes passeios quase diários nos fins de tardes dos finais de semana, meu pai corria puxando o carrinho nas pequenas ondas que vinham na beira da praia para eu ver a água levantar com a velocidade e molhar-me com os pequenos respingos, causando meu divertimento. Eu era muito menino, mas foram fatos tão marcantes e belos que se eternizaram na minha mente, tenho guardado uma foto dirigindo o meu Cadillac.

Muito cedo fomos morar em Porto Alegre, mas sempre vínhamos no final do ano passar as férias no mar de Torres, e em Santa Catarina. Era um tempo em que vir para o mar era coisa de veranista. Quando fiquei mais independente fui para o mar de mochila nas costas, logo estava pegando uma estrada de moto com amigos e namoradas e as vindas para o mar se tornaram mais constantes.

Em nossos roteiros sempre iniciávamos por Torres-RS, dali íamos para Santa Catarina. Nossa primeira parada começava em Laguna, no Farol de Santa Marta, o lugar além de belíssimo tinha muita liberdade e um bom peixinho no Bar do Seu Valdir. Algumas vezes parávamos em Itapirubá, mas nossa preferida era a Praia do Rosa, a mais linda, com uma natureza belíssima e frequentada por um pessoal muito legal, berçário natural das baleias, muito verde ao lado da Lagoa da Ibiraquera, uma lindíssima área de preservação. Gostava (e ainda gosto) de ir ao Rosa Sul e conversar com os pescadores e ouvir os “causos” do Seu Anastácio, pescador antigo do local.

Do Rosa íamos à Ferrugem, Garopaba, Guarda do Embaú e Florianópolis. Em Floripa tenho minhas praias preferidas, dar uma volta na Lagoa da Conceição, ir à Barra da Lagoa mergulhar perto dos costões, e para ir com uma agradável companhia nada supera o Matadeiro, minha preferida na ilha.

Após os vinte anos, criei asas e voei para outros mares, começando no Rio de Janeiro, achando praias belíssimas como Copacabana, Ipanema e Leblon. Mas, o legal era ir para a Praia do Pepino, ali no finalzinho do São Conrado, este era o point com um lindo visual da Pedra da Gávea e um mar muito azul e suas areias bancas. Gostava do pessoal maneiro que frequentava esta praia.  
Outra legal era ir para Arraial do Cabo, ótimo para uns mergulhos e lugares fantásticos, como a Prainha, Gruta Azul e Pontal do Atalaia. Dali, ia até Búzios e passava na Praia dos Ossos para ir na Praia da Azedinha e suas areias cor de caramelo.

Achei belíssimo Porto Seguro, na Bahia, em especial Arraial D’Ajuda. Outra praia que gostei foi Porto de Galinhas, em Ipojuca, no Pernambuco, estas eram mais legais antes da loucura do turismo. Morei com uns amigos no Recife, na beira da Praia da Boa viagem, onde gostava de tomar uma água de coco e conversar com o pessoal das jangadas e o pessoal nativo. À noite curtia os barzinhos e constantemente ia para Olinda, onde tinha amigos, e no carnaval saia num bloco chamado “Segura a Coisa”. Outra praia inesquecível é Canoa Quebrada no Ceará, com suas falésias e Dunas e onde aconteciam os mais lindos luaus. 

Quando morei em Salvador-BA, gostava de caminhar na Praia de Amaralina, comer um acarajé no Jardim de Alá ou dar um pulo na Praia do Forte, e depois em Arembepe curtir uma paz na Aldeia Hippie e ver o Projeto Tamar, que estava iniciando. Porém, meu local preferido em Salvador era Ilha de Itaparica, mais precisamente na Penha, no Mar Grande, perto das ruínas do Forno de Cal. Ali eu passava manhãs mergulhando entre os corais e algumas vezes ajudava os nativos locais a pegar lagostas.  Para o descanso maior, ia para a tranquilidade da Praia do Berlinque via estrada Cacha Pregos, onde gostava de ir com a namorada que levei para Salvador, a qual eu vesti de baiana e me casei, sou um soteropolitano de coração por esta magia vivida.

Há, ia esquecendo-me de um lugar muito especial e muito nosso, que é o Mar da Solidão, na Praia da solidão, onde o próprio nome já o define. Com suas praias paradisíacas, desertas e seus faróis tristes, um lugar ótimo para pescarias e caminhadas, mas com um mar algumas vezes muito furioso, onde você anda por quilômetros sem ver alguém, a não ser algum pescador solitário. Esta praia fica no município de Mostardas-RS, onde fica o Farol da Solidão, dali até o Farol de Tavares-RS, é um lugar de muita paz e tranquilidade onde só se ouve o barulho do mar e os albatrozes. Mostardas fica num istmo formado pela Lagoa dos Patos e o Oceano Atlântico, é um lugar lindíssimo de campos e lagos, muitos açudes e local de parada de aves migratórias.

Cruzei por muitos caminhos e andei por muitos mares do Brasil, aqui citei só os principais, andei por alguns cantos da América Latina. Virei funcionário de gravata, preso numa sufocante sala de um edifício de uma metrópole. Amo Porto Alegre, mas um dia arranquei aquela roupa, joguei fora aquele molho de chaves (parecia um carcereiro), peguei mulher e filho e fui viver no interior, bem perto do mar, com os parentes me chamando de louco por abandonar a metrópole e o lindo e promissor emprego. Optei pela qualidade de vida, fui fazer o que sempre sonhei construí uma casa do meu jeito com muita madeira, com pés de Ipês floridos, palmeiras Juçaras, árvores frutíferas, muita Pitanga, Araçás, Uvas, Butiá, Romãs, Bromélias e Orquídeas.

Vivo muito feliz e de vez em quando vou olhar o mar dos alcantis, caminhar molhando os meus pés no mar, lembrando meu pai e o meu cadilac que ele puxava por sobre as ondas que batem na beira da praia. Voltei para o meu mar, o Mar de Torres, onde ficou meu umbigo e um dia ficarão meus restos, quando chegar o fim desta curta, mas fantástica viagem chamado vida, a qual eu acho que para valer a pena, nada é igual do que a vida na beira do mar. “Ver na vida algum motivo prá sonhar, ter um sonho todo azul, azul da cor do mar...”.

Jaime Baghá, 
Que sempre achou que o mar é de quem o sabe amar e a felicidade é um fim de tarde olhando o mar!