segunda-feira, 25 de julho de 2011


Samuel Beckett e Albert Camus, dois prêmios nobel de literatura, são leituras obrigatórias para quem faz uma opção do absurdo como literatura. Beckett notabilizou-se no teatro do absurdo e Camus nos mostra a filosofia do absurdo em seus ensaios e romances.

A comparação está entre a peça de Beckett, “Esperando Godot” e o romance “O Estrangeiro” de Camus, ambas mostram a falta de sentido da vida humana, nosso universo irracional e uma crítica de nosso inútil esforço para entender o significado dos acontecimentos da vida humana.

“Esperando godot” é a espera de algo que nunca vem, assim como o homem à espera de Deus que nunca chega e termina em coisa nenhuma, deixando para os personagens, Vladimir e Stragon, uma decisão: apenas ir vivendo num mundo irracional. Em “O Estrangeiro”, o personagem Mersault vive numa descrença, num tédio e ao mesmo tempo ele age de maneira indiferente a tudo: a todas as normas sociais, impermeável a todos os valores morais e ao mundo que o rodeia. Um detalhe interessante, foi escrito por Camus em “As Cartas a um Amigo Alemão”, escritas durante a guerra. Nelas, Camus diz: “Acho que o mundo não tem sentido, mas sei que algo nele tem sentido, e é o homem, porque é o único ser que reclama um sentido”.
Jaime



Samuel Beckett foi um dos fundadores do teatro do absurdo, é considerado um dos principais autores do século 20. Sua obra foi traduzida para mais de trinta idiomas.

Beckett nasceu em 1906 em Foxrock, perto de Dublin numa família burguesa e protestante, em 1927 graduou-se em literatura no Trinity College de Dublin, onde estudou também italiano e francês.

Em 1928, foi lecionar em Paris onde conheceu James Joyce, de quem se tornou amigo. Durante o ano de 1930, Beckett lecionou na Irlanda. Nessa época escreveu o estudo crítico "Proust", comentando a obra do grande escritor francês.

No ano seguinte Samuel Beckett fixou residência em Paris e escreveu a sua primeira novela, "Dream of Fair to Middling Women", que seria publicada somente depois de sua morte.

Em 1933, voltou a Dublin por motivos familiares, mas retornou a Paris em 1938. Nessa época, levou de um estranho uma facada no peito e ficou gravemente ferido.

No início da Segunda Guerra Mundial, Beckett vinculou-se à Resistência Francesa, juntamente com sua esposa, Suzanne Deschevaux-Dusmenoil. Em 1942, foi obrigado a fugir para Vichy, onde escreveu parte da novela "Watt". É no pós-guerra que vive o período mais intenso da sua produção literária.

A partir de 1945, o seu idioma literário passou a ser o francês. Entre 1951 e 1953 escreveu uma trilogia ("Molloy", "Malone Morre" e "L'Innommable"), cujo tema é a solidão do homem. Com "Esperando Godot", Beckett iniciou, ao mesmo tempo que Ionesco, o teatro do absurdo. Depois começa a traduzir os seus textos para inglês e volta a escrever também nesta língua. Constrói uma obra dupla, bilíngue, cada vez mais depurada.

Posteriormente ainda escreveu, além de algumas obras narrativas, diversas peças teatrais, como "Fim de Festa", "Ato sem Palavras" e "Os Dias Felizes".

Em 1969, Beckett ganhou o Prêmio Nobel de Literatura, distribuindo o dinheiro pelos amigos. Durante a vida escreveu poemas e textos em prosa, como romances, novelas, contos e ensaios, além de textos para o teatro, o cinema, o rádio e a televisão.

Samuel Beckett morreu em 1989, cinco meses depois de sua esposa. Foi enterrado no cemitério de Montparnasse.

[três poemas de amor]

cascando

1

fosse apenas o desespero da
ocasião da
descarga de palavreado

perguntando se não será melhor abortar que ser estéril

as horas tão pesadas depois de te ires embora
começarão sempre a arrastar-se cedo de mais
as garras agarradas às cegas à cama da fome
trazendo à tona os ossos os velhos amores
órbitas vazias cheias em tempos de olhos como os teus
sempre todas perguntando se será melhor cedo de mais do que nunca

com a fome negra a manchar-lhes as caras
a dizer outra vez nove dias sem nunca flutuar o amado
nem nove meses
nem nove vidas

2

a dizer outra vez
se não me ensinares eu não aprendo
a dizer outra vez que há uma última vez
mesmo para as últimas vezes
últimas vezes em que se implora
últimas vezes em que se ama
em que se sabe e não se sabe em que se finge
uma última vez mesmo para as últimas vezes em que se diz
se não me amares eu não serei amado
se eu não te amar eu não amarei

palavras rançosas a resolver outra vez no coração
amor amor amor pancada de velha batedeira
pilando o sono inalterável
das palavras

aterrorizado outra vez
de não amar
de amar e não seres tu
de ser amado e não ser por ti
de saber e não saber e fingir
e fingir

eu e todos os outros que te hão-de amar
se te amarem

3

a não ser que te amem

Samuel Beckett
(tradução de Miguel Esteves Cardoso in As Escadas não têm Degraus 3, livros Cotovia - Março de 1990)

Peças, romances, novelas, contos, prosa, ensaios, poesias, a produção Becketiana é um ícone, uma veemente crítica a modernidade. Beckett é dos meus autores preferidos, com seu especial sendo sardônico de humor negro, é uma língua suja engenhosa, fala da escória, das putas e dos canalhas com muito talento.

Beckett mostra o sujo e joga limpo, não me engana, não me tapeia e vai aonde muitos autores não se atrevem com medo de cair ou escorregar no lugar comum. Ele é o rei da nossa grande realidade, da metáfora, da ironia e do sarcasmo, um mestre que nos desnuda inteligentemente e mostra o existencialismo, o trágico, a solidão, o pessimismo e o absurdo da condição humana, o resto é conto de fadas para iludir nossas vidas. Porém, não se iludam, porque é preciso estar preparado para o estilo Beckettiano, nele não existe meios termos, ou você mata a obra ou descobre o olimpo do prazer literário.

Eu, além do prazer, curto o sentido de fugir do lugar comum, espiando pela ótica de Beckett o contrário do bom senso e as doutrinas que o comum tenta me inculcar. O interessante em Beckett é que no início a literatura parece tola, mas aos poucos você percebe que até o silêncio das falas dos personagens não são simples inerrupções, são para refletir, respirar, pensar, entender o poderoso simbolismo subjacente da obra.

Se os personagens estiver esperando Godot na rua, esperam alguém que lhes dê o sentido da vida, se estivessem numa prisão, estariam esperando pela liberdade, todos nós estamos esperando alguém que responda nossas angustiantes perguntas, todos nós somos personagens de Beckett.
Jaime

“Fail. Fail again. Fail better”.

“Falhar. Falhar de novo. Falhar melhor”.
Samuel Beckett

"De todas as definições sobre Beckett, para mim a melhor foi como Harold Pinter, outro grande representante do Teatro do Absurdo (nobel em 2005), assim o definiu:
Quanto mais longe ele vai mais bem me faz. Não quero filosofias, panfletos, dogmas, credos, saídas, verdades, respostas, nada a preço de saldo. Ele é o escritor mais corajoso e implacável que aí anda e quanto mais me esfrega o nariz na merda mais reconhecido lhe fico. Não se põe a gozar com a minha cara, não está a levar-me à certa, não me vem com piscadelas de olho, não me oferece um remédio nem um caminho nem uma revelação nem um balde cheio de migalhas, não me está a vender nada que não queira comprar, está-se borrifando para se eu compro ou não, não tem a mão sobre o coração. Bom, vou comprar-lhe a mercadoria toda, de fio a pavio, porque ele espreita debaixo de cada pedra e não deixa nenhum verme sozinho. Faz nascer um corpo de beleza. A sua obra é bela."
Harold Pinter, 1954


Samuel Beckett traz mais uma vez o silêncio, “o abismo de consciência” que recai sobre a solidão da fantasiosa sociedade burguesa ocidental, palco das críticas do Teatro do Absurdo.
“Resta pouco a dizer numa última tentativa de sofrer menos.”




Seus temas destacam o isolamento do homem em ambientes estranhos, o absurdo da vida e do universo e o exame da moral e da condição humana. A obra desse grande romancista, dramaturgo, ensaísta e filósofo, abordou a alienação e o desencanto do homem no pós-guerra.

Com o falecimento do pai em combate na Primeira Guerra Mundial, menos de um ano depois do seu nascimento no dia 7 de Novembro de 1913, sua mãe levou-o, junto com a família, para morar num bairro pobre de Argel, capital da Argélia. Aluno muito inteligente, ganhou uma bolsa de estudos para o liceu de Argel, de onde foi para a Universidade de Argel a fim de estudar Filosofia.

Desportista dedicado e exímio futebolista, suas ambições de atleta foram, todavia, frustradas pela tuberculose. Albert Camus direcionou então sua atenção para a literatura. Estudou os clássicos franceses e a política de esquerda e atuou durante algum tempo no Partido Comunista Argelino, em 1935, até ir trabalhar como jornalista para o jornal socialista Alger-Republicain. A paixão pelo teatro o levou a escrever, produzir e atuar no Théâtre du Travail. Apesar de só ter sido produzida em 1945, sua peça Calígula foi escrita pouco antes de suas obras mais admiradas.

Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial, aos 25 anos de idade foi para a França juntar-se ao movimento de resistência à ocupação alemã, trabalhando como editor do diário parisiense clandestino Combat. Foi nessa época tumultuosa que escreveu seu primeiro e mais celebrado romance O Estrangeiro (publicado em 1942). Nele, o jovem argelino Meursault é levado a julgamento por matar um árabe. Entretanto, não é a natureza do crime que ofende o tribunal, mas sua recusa em sentir remorso. Meursault é considerado subumano, um perigo para a sociedade por sua não conformidade. Seu desapego e sua alienação emocional acabam levando-o à morte. A sensação de absurdo e a falta de sentido do mundo são temas recorrentes em Camus, pelo que acabaria sendo rotulado de existencialista, ao lado de seu então amigo Jean-Paul Sartre.

O ensaio filosófico O Mito de Sísifo (seu primeiro ensaio publicado em 1942) deu continuidade à sua exploração do absurdo e da inútil busca humana de significado num mundo incompreensível. Camus nos apresenta vários dualismos paradoxais, como a asserção de que a vida tem um grande valor, porém é banalizada pela morte, que a priva de significado. Sua conclusão é de que, para sobrevivermos, é melhor deixar de lado as ambições e concentrarmo-nos no cotidiano.

A fé persistente de Camus na bondade intrínseca do homem é, no entanto, mais bem retratada em seu segundo romance, publicado em 1947, intitulado A Peste, um relato alegórico da ocupação nazista da França em que os cidadãos da cidade argelina de Oran são assolados por uma praga de ratos e isolados do mundo exterior. O triunfo final do espírito humano é o resultado da decisão unilateral de trabalhar juntos em vez de buscar soluções pessoais.
Camus examinou a ideia de rebelião em seu longo ensaio O Homem Revoltado (publicado em 1951). Na década de 1950, dedicou também boa parte de seu tempo a questões de direitos humanos, defendendo a abolição da pena capital em todo o mundo e denunciando a repressão soviética da Revolução Húngara em 1956. Nesse mesmo ano publica seu último romance, A Queda - uma série de elegantes monólogos do bem-sucedido advogado de defesa parisiense Jean-Baptiste Clemence. A história de Clemence equivale a uma confissão: toda uma vida dedicada a ajudar os fracos e oprimidos se desmancha na hipocrisia complacente de ações realizadas para sua exclusiva satisfação. Em 1957 (No mesmo ano da publicação de seu livro de contos O Exílio e o Reino), aos 44 anos de idade, Camus ganhou o Prêmio Nobel de Literatura. Aproximadamente três anos depois, seu filho falece e, posteriormente, Camus morre no dia 4 de Janeiro de 1960, num acidente de automóvel, nos arredores da cidade de Sens, na França.



A obra de Camus é grandiosa, magnífica, além do absurdo, Camus nos mostra a revolta, cada um associado a um mito grego, Sísifo o absurdo e Prometeu a revolta, Entre a minha preferidas, além do “O Estrangeiro”, esta “A peste”, uma alegoria ao nazismo e por extensão uma crítica a todo regime totalitário. “O Homem Revoltado”, é aquele homem que diz não a tudo o que força seus limites, a tudo que o violenta e o priva de exercer livremente o que considera seus direitos, mas sabe também que sua revolta deve respeitar alguns limites. Jean Paul Sartre (filósofo existencialista francês), não gostou do homem revoltado, é que para Sartre só existia o homem revolucionário, mas este fato, suas amizades e desavenças é outra história.
Jaime


"Penso agora em flores, sorrisos, desejo de mulher, e compreendo que todo o meu horror de morrer está contido em meu ciúme de vida. Sinto ciúme daqueles que virão e para os quais as flores e o desejo de mulher terão todo o seu sentido de carne e de sangue. Sou invejoso porque amo demais a vida para não ser egoísta... Quero suportar minha lucidez até o fim e contemplar minha morte com toda a exuberância de meu ciúme e de meu horror."
Albert Camus