A classe politica vista pelo prisma de Claudio Kambe |
CLASSE MÉRDEA
Virou até moda, por exemplo, a proclamação de que
se é um marginal da classe média. Ou mérdea. A segunda forma, num tempo em que
o jogo de palavras e o uso da palavrada passaram a valer como sinal de talento,
é mais elegante. Mérdea. Podendo grafar isso, então, é o fino do espírito.
Compõe bem. Soa a criativo. E, útil, começa a faturar, o que é conveniente e de
oportunidade boa.
Mas da classe média você não vai escapar, seu. A
armadilha é inteiriça, arapuca blindada, depois que você caiu. Tem anos e anos
de aperfeiçoamento, sofisticação, tecnologia, ah o cartão de crédito, o cheque
especial, o financiamento do carro, da casa própria e do resto da merdalhada
que for moda e, meu, sem ela você não vive. Não respira, é ninguém. Ou melhor, é
nada: você já virou coisa do sistema. E não pessoa. Dane-se. Futrique-se, meu
bom, meu paspalho, pague prestação pelo resto da vida. E o carro, é preciso o
carro. Os donos da arapuca querem você comprando. Compre. E de carro. Ande de
carro, ouça música e veja filmes no carro, coma no carro e trepe ali.
Todos os leros. Todos os embelecos, do automóvel ao
secador de cabelos, principalmente você deve comprar o de que não precisa. A
tevê vai te comandar a vida, meu chapa. A cores. E destas regras do jogo não
vai escapulir. Bufonear a classe média, pajear, aturar e ser como ela. Quer
queira, quer não.
Afinal, já não está em tempos em que possa pensar
com sua cabeça. Ô, meu, você é só manada. Bem pequenininho, lá, no meio da
manada. E quieto, bom comprador. Esbirro, sabujo, capacho.
João Antônio, 1986
Monalisa - Bansky |
DEBOCHE
O
que me diferencia?
Ora,
o que me diferencia,
Eu
sou o que tu vê
E
pensa,
Insólito!
Sou
a diferença,
O
que procura
E
te atura.
Que
provas me dão teus deuses,
Tão
maus.
Eu
sou o onipresente,
Não
tua onírica,
Incógnita
da tua imaginação,
Tua
inquietação.
Sou
tua resposta vazia,
Tua
afasia.
Olho
teus olhos,
Preso
ao desterro,
Alforriado,
Eu
procuro o erro,
Um
pouco amanhã,
Porque
escrevo.
A
arte me faz diferente
Você
reza,
Ora
,
Medita
Inventa-me,
Expulsa
O
que nunca viu acredita!
Sua
mente incompleta
Delira,
Não
acerta,
Não
tem o louco devaneio,
É
fátuo,
Feio,
Eu,
poeta.
Sou
como você
Interrogação!
Mas
sou o que fica,
O
erro,
A
razão,
Que
se expõe a dor,
Na
despedida da amante,
Risos
largos,
Em
momentos de amor.
Sou
o ser refinado,
Impuro,
Comedido,
Gentil.
Pelo
teu inferno
Deixo
levar-me aos láudanos,
Um
fauno senil.
Eu
vanguarda,
Tendência.
Você
perdido,
Dividido
ao nada,
Entre
prato e bispote,
Pacóvio
do meu mote.
Indignado,
um dia de deboche – Jaime Baghá
MAU HUMOR
Não me lembro direito,
mas li numa revista, um artigo levantando a hipótese de que todo o cara que tem
mania de fazer aspas com os dedinhos quando faz uma ironia, é um chato.
Num outro artigo alguém
escreveu que achava que jamais tinha conhecido um restaurante de boa comida com
garçons vestidos de coletinho vermelho.
Joaquim Ferreira dos
Santos, em "O Globo" de domingo, fala do seu profundo preconceito com
quem usa a expressão "agregar valor".
E os gerúndios. Eu posso jurar que toda mulher que anda permanentemente com uma garrafinha de água e fica mamando de segundo em segundo é uma chata. São preconceitos, eu sei. Mas cada vez mais a vida está confirmando estas conclusões.
E aquelas que se dizem:
"força na peruca, amiga" ou que se chamam de "diva, maravilhosa,
poderosa e afins"? Imagino logo um grupo de mulheres fracassadas,
desesperadas por alguém (masculino, é claro) que pense tudo isto delas. Fujam destas.
Um outro amigo meu jura
que um dos maiores indícios de babaquice é usar o paletó nos ombros, sem os
braços nas mangas. Por incrível que pareça, não consegui desmentir. Pode ser
coincidência, mas até agora todo cara que eu me lembro de ter visto usando o
paletó colocado sobre os ombros é muito babaca.
Já que estamos nessa
onda, me responda uma coisa: você conhece algum natureba radical que tenha
conversa agradável?
O sujeito ou sujeita que
adora uma granola, só come coisas orgânicas, faz cara de nojo à simples menção
da palavra "carne", fica falando o tempo todo em vida saudável é seu
ideal como companhia numa madrugada? Sei lá, não sei. Não consigo me lembrar de
ninguém assim que tenha me despertado muita paixão.
Eu ando detestando certos
vícios de linguagem, do tipo "chegar junto", "superar
limites", essas bobagens que lembram papo de concorrente a big brother.
Mais uma vez, repito:
acho puro preconceito, idiossincrasia, mas essa rotulagem imediata é uma mania
que a gente vai adquirindo pela vida e que pode explicar algumas antipatias
gratuitas. Tem gente que a gente não gosta logo de saída, sem saber direito por
quê. Vai ver que transmite algum sintoma de chatice.
Tom de voz de operador de
telemarketing lendo o script na tela do computador e repetindo a cada cinco
palavras a expressão "senhooorr", me irrita profundamente.
Se algum dia eu matar
alguém, existe imensa possibilidade de ser um flanelinha. Não posso ver um
deles que o sangue sobe à cabeça. Deus que me perdoe, me livre e me guarde, mas
tenho raiva menor do assaltante do que do cara que fica na frente do meu carro,
fazendo gestos desesperados tentando me ajudar em alguma manobra, como se
tivesse comprado a rua e tivesse todo o direito de me cobrar pela vaga. Sei que
estou ficando velho e ranzinza, mas o que se há de fazer?
Não suporto especialista em motivação de pessoal que obrigue as pessoas a pagarem o mico de ficar segurando na mão do vizinho, com os olhos fechados e tentando receber "energia positiva". Aliás, tenho convicção de que empresa que paga bons salários e tem uma boa e honesta política de pessoal não precisa contratar palestras de motivação para seus empregados. Eles se motivam com a grana no fim do mês e com a satisfação de trabalhar numa boa empresa. Que me perdoem todos os palestrantes que estão ficando ricos percorrendo o país, mas eu acho que esse negócio de trocar fluidos me lembra putaria.
Não suporto especialista em motivação de pessoal que obrigue as pessoas a pagarem o mico de ficar segurando na mão do vizinho, com os olhos fechados e tentando receber "energia positiva". Aliás, tenho convicção de que empresa que paga bons salários e tem uma boa e honesta política de pessoal não precisa contratar palestras de motivação para seus empregados. Eles se motivam com a grana no fim do mês e com a satisfação de trabalhar numa boa empresa. Que me perdoem todos os palestrantes que estão ficando ricos percorrendo o país, mas eu acho que esse negócio de trocar fluidos me lembra putaria.
E, para terminar: existe
qualquer esperança de encontrar vida inteligente numa criatura que se despede
mandando
"um beijo no coração"?
Lula Vieira - Publicitário
Nenhum comentário:
Postar um comentário