ERA UM GAROTO QUE COMO EU...
Eu tinha quinze anos e usava uma calça tão justa que o pé
quase não podia entrar e alisava o meu cabelo para ficar parecido com os
cantores da época, com uma franja que os meus cabelos crespos não ajeitavam.
Namorava a filha da vizinha e íamos ao cinema na matinê assistir os filmes de
John Ford com o John Wayne correndo para salvar a mocinha em perigo, ou os
melosos filmes italianos do Gianni Morandi que fazia eu e a namorada encher os
olhos de lágrimas de mãos dadas, ou com o riso solto com os filmes da Atlântida
com Oscarito, Grande Otelo, Anselmo Duarte, Lana Bitencourt e gostava do
seriado do Durango Kid que antecedia o filme. Festa era reunião dançante em
casa, nas garagens embaladas por Roberto Carlos, Renato e seus Blue Caps,
Beatles e outros.
Comecei a perder a inocência com a chegada do movimento
Hippie e toda sua rebeldia e logo tínhamos o tropicalismo com suas letras
inteligentes e questionadores. Nunca mais fui o mesmo, ia para o Parque da
Redenção em P. Alegre me juntar aos Hippies e ver as meninas com suas roupas
coloridas e flores nos cabelos dançar no gramado. Nunca mais fui o mesmo e meus
cabelos puderam voltar ao normal, crespos, longos e desgrenhados eram um
sucesso da moda, que combinavam com minha calça e jaqueta Lee que comprávamos
de contrabando no cais do porto até a primeira
loja aparecer vendendo na cidade. Para estar mais ligado ao movimento
comprávamos roupas na Boutique Lixo que segundo diziam, vinham de navios do
Vietnã. Usávamos estas roupas militares americanas, para confrontar numa
rebeldia a ditadura. Meu pai começou a ficar preocupado e os vizinhos falavam
da moda, das danças esquisitas (separados), dos cabelos compridos, das roupas fora
dos padrões e do cheiro de maconha nas esquinas. Como os comportados ainda era a grande maioria,
sentíamos que éramos uma espécie de privilegiados por entender as letras das
músicas, dos horrores das mortes dos jovens na guerra do Vietnã. Éramos uma
espécie que entendia os protestos e as letras que Chico Buarque estava cantando e se embalar com Janis Joplin e
Hendrix. Alguns mais intelectualizados tinham um pé em Miles Davis, Charlie
Parker e a poesia Beat. Eu nunca mais fui o mesmo e gostei muito de ter passado
por isto, curtir Porto Alegre a noite, ir no Bar Escaler no Bairro Bom Fim e apesar de bem jovem,
conhecer a “Esquina Maldita” pra ouvir um pouco de política e de viver
diferenciado numa época que me tornou diferente para todo o sempre e sem querer
ser saudosista, acho que o mundo deveria ter continuado uma época de Aquarius,
pois não acho legal este modernismo sem romantismo em que o cara já nasce
transando e dando porrada
Pequena crônica de um
jovem feliz. Jaime Baghá
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